1917. União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. Partido Comunista da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, os socialistas, na sua guerra assimétrica pelo imaginário coletivo, usando uma forma de “discurso de amor” à pureza e à superioridade da autodenominada “classe proletária”, criminalizavam suposto “discurso de ódio” que imputavam ao “outro”, isto é, aos “burgueses”.
1933. Alemanha. Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães, os nazistas, na sua guerra assimétrica pelo imaginário coletivo, utilizando igualmente uma espécie de “discurso de amor” à pureza e à superioridade da autoidentificada “raça ariana”, criminalizavam um inexistente “discurso de ódio” que atribuíam ao “outro”, ou seja, simbolizado nos “judeus”.
1939. Resultados aterradores do pacto de não agressão e de divisão territorial da Europa entre os dois nefastos regimes que se autoproclamavam monopolistas do “discurso de amor”: Segunda Guerra Mundial, estimados 50 milhões de mortos, holocausto de 6 milhões de judeus…
O filósofo Eugen Rosenstock-Huessey, em seu livro A Origem da Linguagem, ensina que “Toda e qualquer ordem política expande o tempo que limita uma pessoa e o espaço que a contém para além dos confins da própria vida. Essa expansão é ‘antinatural’, ‘sobrenatural’, ‘transcendente’ e não se dá automaticamente. Estabelece-se pela devoção e dedicação do homem a essa tarefa imprevista e imprevisível”.
À luz desse ensinamento, observa-se que o totalitarismo, como ordem política, em qualquer de suas formas, nazista, fascista, comunista, socialista, em seus motivos e consequências, é ‘antinatural’, ‘sobrenatural’, ‘transcendente’, estabelece-se pela devoção e dedicação do homem, sendo a linguagem o lugar de confronto, no qual se definem o bem e o mal, em suas dimensões subjetivas e objetivas, espaciais e temporais.
“1984”. Distopia. “Guerra é Paz. Liberdade é Escravidão. Ignorância é Força”. O romancista George Orwell, em sua magna obra: “Ao futuro ou ao passado, a um tempo em que o pensamento seja livre, em que os homens sejam diferentes uns dos outros, em que não vivam sós – a um tempo em que a verdade exista e em que o que for feito não possa ser desfeito: Da era da uniformidade, da era da solidão, da era do Grande Irmão, da era do duplipensamento – saudações!”
Em novilíngua duplipensante, ou seja, no âmbito da linguagem, as ordens políticas totalitárias, nazista, fascista, comunista, socialista, desde sua perspectiva subjetiva, desvinculada da realidade objetiva, promovem-se invocando suposto “discurso de amor” à pretensa superioridade e pureza da raça, do Estado, da classe, do partido (nós), que implica, consequentemente, atribuir ao “outro” (eles) o mal absoluto. O outro (eles), sua vez, tem suas vislumbradas reações indexadas preventivamente em “discurso de ódio” contra (nós).
2019. Brasil. Vivencia-se, nesta plaga, uma atualização da guerra assimétrica pelo imaginário, em que a linguagem é o campo de batalha e a novilíngua duplipensante é a arma, da qual o projetil é a rotulagem “discurso de ódio”. Nesse confronto, o establishment político-midiático utiliza os meios de ação ao seu dispor para se autopromover como monopolista do "discurso de amor" consubstanciado na liberdade de informação, conhecimento e opinião; e criminalizar as vozes que considera dissonantes, ou seja, “inferiores”, “impuras”, “mentirosas”, acusando-as de promover “discurso de ódio”.
Com efeito, percebe-se que a internet, a ágora contemporânea, é o espaço da linguagem onde a guerra assimétrica pelo imaginário se desenrola com maior intensidade. De um lado, o establishment político-midiático se utiliza de todos os meios de ação para ameaçar, constranger, silenciar, eliminar qualquer voz que eventualmente represente risco ao seu monopólio do poder de estabelecer, desde a sua visão, o bem e o mal, o certo e o errado, a virtude e o vício, a verdade e a mentira… o "discurso de amor" e o "discurso de ódio".
De outro lado, o ser humano atomizado, débil de meios de ação, todavia, a quem a internet possibilita conectar-se entre si, produzindo e trocando informações, conhecimentos, opiniões, participando ativamente da vida cultural, libertado, por conseguinte, do totalitarismo imposto pelo establishment político-midiático.
A par disso, não se pode negligenciar o extraordinário poder econômico, social e político concentrado nas mãos do establishment político-midiático, que inclui os maiores provedores de aplicações do mundo, os quais mantêm redes sociais na internet em operação no Brasil. Cabe indagar: eles têm o direito de assumir para si o poder de vida e morte civil do ser humano nessa ágora global?
O debate está posto em órgãos e instituições do Estado brasileiro (Poderes Legislativo, Executivo, Judiciário, Ministério Público etc.), bem como em partidos políticos, imprensa, ONGs, movimentos sociais etc.
Porém, a sociedade, especialmente o cidadão comum, não pode alhear-se, negligenciando o risco de que, a pretexto de se combater suposto “discurso de ódio” dos atuais “burgueses”, “judeus”, “impuros”, imponha-se, ainda que dissimuladamente, verdadeira censura ilícita à liberdade de manifestação de pensamento, expressão intelectual, artística, científica e de informação, e ao acesso de todos ao conhecimento e à participação na vida cultural propiciada pela internet.
“O preço da liberdade é a eterna vigilância”.
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