Participei de uma audiência
judicial, num processo decorrente de ação civil pública movida pelo Ministério
Público Federal em desfavor da União (governo federal), que visa corrigir
situações ilícitas no Cadastro Único dos programas sociais (CadÚnico), sob
gestão federal do Ministério do Desenvolvimento Social.
Durante a audiência, chamaram-me
atenção os depoimentos de agentes públicos, ouvidos na condição de testemunhas,
responsáveis pela gestão do CadÚnico e de programas sociais vinculados ao
mesmo. Alguns fatos, que fundamentam a ação do Ministério Público, foram
cabalmente ratificados.
Entre tais fatos, ressaltam-se:
primeiro, a gestão federal recomenda que não sejam exigida nenhuma comprovação
de renda das pessoas que solicitam inscrição no CadÚnico, ou seja, devem valer
exclusivamente as declarações, verídicas ou não, da pessoa que solicita
inscrição; segundo, o CadÚnico não oferece opção para o cidadão fazer pedido
consciente, voluntário e expresso, assumindo responsabilidade por suas
declarações, de qualquer benefício social vinculado ao cadastro; terceiro, a
concessão de benefícios do Programa Bolsa Família é realizada de forma
automática pelo governo federal, sem nenhum pedido expresso do beneficiário,
com base apenas nas declarações deste, sem necessidade de provas.
Diante desses fatos, recorça-se a
convicção de que a estruturação, gestão e funcionamento do CadÚnico, bem como
dos programas sociais ao mesmo vinculados aumentam sobremaneira a possibilidade
de fraudes, especialmente no Bolsa Família. Com efeito, é motivo de perplexidade
a resistência do governo federal em fazer as devidas correções.
Mais grave, ainda, é que nem as
notícias corriqueiras de fraudes na concessão de benefícios do programa Bolsa
Família, inclusive com espúrias finalidades eleitoreiras, são capazes de
motivar o governo federal a fazer as necessárias e adequadas correções
apontadas pelo Ministério Público Federal.
De tudo isso, exsurge
insofismável que o CadÚnico e os programas sociais vinculados ao mesmo
prestam-se a perpetuação do patrimonialismo do Estado brasileiro, isto é, a
coisa pública dominada como se fosse propriedade pessoal, familiar ou
partidária do governante.
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